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Edição: Cristiane Schardosim Martins
Transcrição: Cristiane Schardosim Martins e Guta Teixeira

Na conversa entre Lama Padma Samten e Alejandro Chaoul ocorrida no dia 13 de janeiro de 2025, no CEBB Sukhavati, em Quatro Barras-PR, diversos temas foram abordados, entre eles a interconexão entre saúde, energia e práticas budistas. Na oportunidade, Lama Samten nos convidou a refletir sobre o corpo e a mente a partir de uma perspectiva mágica e não dual, onde o movimento energético — e não a matéria densa — é visto como o sustentador da vida.

Alejandro é fundador e diretor do Instituto Jung Center’s Mind Body Spirit. Ele estuda o Budismo tibetano desde 1989, com foco na tradição Bön desde 1991. Como professor sênior da Academia The 3 Doors, ele ensina yoga tibetano e meditação no Ligmincha International. Além disso, Alejandro tem uma trajetória de mais de 20 anos ensinando meditação tibetana para pacientes com câncer, seus familiares e cuidadores e pesquisa os benefícios das práticas corpo-mente tibetanas no MD Anderson Cancer Center, onde atuou como professor assistente e diretor de Educação no Programa de Medicina Integrativa.

Neste trecho da conversa, Lama Samten explora como as tradições budistas oferecem uma abordagem única para compreender a saúde, transcendendo os limites da medicina tradicional e trazendo um olhar profundamente integrado e transformador.


Pesquisas científicas e o estreitamento de ideias amplas

Nós estamos falando de pesquisas científicas que começam com uma ideia ampla, mas que não estão comprovadas. Essas ideias amplas, que não estão comprovadas, vêm do Budismo, especialmente do Budismo tibetano e talvez da medicina tibetana. Quando trazemos essas ideias para o ambiente da ciência, elas acabam se tornando muito estreitas.

O mundo causal e o mundo mágico

Esse ambiente amplo que percebemos no Budismo é reduzido ao se trabalhar no campo causal. Na linguagem budista, consideramos que esse campo causal pertence ao samsara. No entanto, na vida cotidiana, não falamos em samsara; falamos do mundo como ele é. Para nós, budistas, isso não faz muito sentido, porque esse mundo não é um mundo puramente causal — ele é um mundo mágico. Portanto, precisamos retornar a essa visão mágica.

Corpo e energia: a base da prática

Olhando a partir do lugar livre da mente, de onde as coisas surgem, vemos claramente que o nosso corpo é um conjunto de materiais — assim como as árvores e outros seres. Esses materiais emergem como uma onda, são sustentados por um tempo e, então, cessam, retornando ao ambiente.

Quando a energia dos cinco elementos cessa, os materiais do corpo não permanecem mais no corpo; eles simplesmente se espalham no ambiente de onde vieram e para onde estão constantemente fluindo. Nós somos, essencialmente, um movimento energético, e não uma manifestação densa. Nossa vida não é explicada pelo aspecto denso, mas pelo aspecto energético.

No Tsa Lung [uma série de antigas práticas iogues que promovem o equilíbrio e a harmonia do nosso corpo físico, da nossa energia e mente] , estamos movimentando essa energia — o verdadeiro sustentador do nosso corpo. Não são os ossos, nem as células que o mantêm, mas a energia que propicia essa sustentação.

A perspectiva budista e a ciência

Como budistas, precisamos raciocinar a partir dessa visão, porque os cientistas não farão isso.

As quatro iniciações e os corpos de Buda

O ponto central da prática é tomar as quatro iniciações. Ao reconhecermos que a oitava consciência é a base onde estamos, percebemos que vivemos em um ambiente contaminado. Por exemplo, se acreditamos que estamos dentro de um templo, estamos perdidos. Na verdade, estamos em um ambiente amplo que sustenta o templo.

Esse ambiente amplo é o Darmakaya. Quando tomamos a iniciação do corpo, reconhecemos que nosso corpo também é Darmakaya.

A partir da mente livre, podemos observar os condicionantes, incluindo as doenças, e enxergá-los como energia, causalidade e originação dependente. Vendo isso, acessamos o Dharma, que é a lucidez. Essa lucidez é o Sambogakaya.

Quando caminhamos no mundo com essa inteligência, isso é o Nirmanakaya. Nosso corpo se torna saudável, movendo-se com lucidez. E, ao atingirmos a quarta iniciação, o Sabavavikakaya, alcançamos uma saúde que transcende nascimento e morte.

A influência do ambiente e a visão mágica

Por outro lado, se, ao invés de perceber o templo como um lugar puro, o vemos como uma prisão por estarmos contrariados, nossa energia se movimenta de forma diferente.

Eu vejo um adoecimento na forma como olhamos o mundo, pois essa visão movimenta nossa energia. Temos padrões diários de energia perturbada que surgem de várias maneiras.

Por exemplo, assim como o músculo responde a estímulos na academia, nossas emoções perturbadoras e os venenos da mente criam padrões de energia que nos levam ao adoecimento.

Doenças e os cinco elementos

Uma direção interessante para nós, budistas, é observar essas doenças com cuidado, a partir dos cinco elementos e do que eles sustentam. Aqui no templo, por exemplo, temos o elemento terra, que aparece como a própria construção. No entanto, isso é ilusório, porque o templo é uma manifestação não dual da mente, uma construção mágica.

Por isso, realizamos a consagração, para que o templo passe a existir magicamente como tal. Ainda assim, ele não escapa do espaço e das cinco sabedorias.

A origem dos ensinamentos e o desafio dos praticantes

Buda explicou tudo isso. Esses ensinamentos não surgiram do Vajrayana ou do Budismo tibetano; eles têm origem na tradição Pali, onde o Buda os detalhou. Como praticantes, podemos olhar para as doenças de forma mágica. Esse é o grande desafio que me move.

A mandala da saúde e os limites da medicina tradicional

Esse é o sentido da mandala da saúde. Não vamos transformá-la em medicina tradicional. Esse diálogo até pode acontecer, mas ele não é o ponto principal. Não temos recursos nem linguagem para tratar disso dentro da medicina tradicional.

A medicina tradicional fragmenta tudo. Por exemplo, não podemos dizer se a energia que sentimos é do ambiente ou nossa, porque não há separação. A linguagem da energia opera em outro padrão, que não é dual.

 

Você pode acessar a íntegra da conversa clicando AQUI


Matéria publicada em 11/05/2025
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