A verdadeira liberdade

Reflexões sobre o caminho para a transformação do ponto de vista de quem está encarcerado


Por
Revisão: André Luís Daguerre e Cristiane Schardosim Martins
Edição: Carol Franchi
Tradução: Carol Franchi

Neste inspirador texto, intitulado “Verdadeira Liberdade”, publicado originalmente pela Upaya Zen Center, o autor Alfred McGlory, que está preso desde 2010 e pratica o Zen há três anos, compartilha sua perspectiva sobre o significado da liberdade e como alcançá-la, mesmo diante das circunstâncias mais desafiadoras. Ele nos convida a refletir sobre a separação que muitas vezes sentimos em relação à sociedade e nos apresenta uma visão transformadora: a liberdade que reside dentro de nós mesmos. Se você busca uma nova perspectiva sobre a liberdade interior, essa é uma leitura imperdível.


A prisão nunca foi a vida que eu pretendia para mim quando era criança. Aposto que esse também não era o seu plano. Em algum momento de nossas vidas, algo deu terrivelmente errado e o que quer que tenha sido foi suficiente para criar uma separação entre nós e a sociedade.

Estou aqui para compartilhar com todos vocês como podemos nos libertar. Agora, a liberdade à qual me refiro não é apenas sair da prisão. Isso seria realmente maravilhoso se fosse tão fácil assim. A liberdade à qual me refiro é a liberdade que reside em nosso próprio ser. Refiro-me à liberdade do sofrimento, do desespero, da raiva e do nosso egoísmo. Uma vez alcançada, não há nada fora de nós que possa nos machucar.

Há uma história de um velho cão de caça sentado em um prego, uivando de dor. Claramente ele estava sofrendo. Quando alguém viu o seu sofrimento e perguntou “por que ele não sai do prego?”, o dono respondeu “ainda não dói o suficiente”. O ponto é que as pessoas geralmente não procuram mudanças até que as coisas se tornem intoleráveis. Esperamos até que a vida nos leve ao nosso momento mais baixo antes de considerarmos fazer algo novo. Muitas vezes isso significa que algo realmente ruim precisa acontecer conosco; algo ruim o suficiente para romper nossa rotina diária de ignorância. Ignorância no sentido de não ver as coisas como realmente são.

A maioria de nós vive nossas vidas remoendo o passado ou fantasiando sobre o futuro. Raramente percebemos o momento presente. A realidade é que tudo acontece no momento presente. Se quisermos um futuro mais brilhante, devemos começar nosso trabalho a partir do presente, não do passado ou do futuro. Encaremos a realidade: o passado era real quando era presente. O futuro se tornará real quando se tornar presente.

Tudo depende do momento presente. Se queremos uma base bem-sucedida para trabalhar, devemos lembrar de manter nossa mente no aqui e agora. O momento presente também é onde está nossa verdadeira liberdade. Não importa quem somos ou onde estamos, podemos ser livres. Não importa se estamos fora da prisão ou trancados na masmorra mais profunda da prisão de segurança máxima do país; podemos ser livres.

A liberdade deve ser cultivada e praticada todos os dias, no momento presente. Não há hora ou lugar especial. O único tempo que existirá é agora; o único lugar onde estaremos é aqui, enquanto comemos, sentamos, caminhamos, conversamos ou apenas apreciamos um copo de água.

Devemos tomar o controle de nossa mente e não nos distrair com o que pensamos que aconteceu antes ou depois do momento presente. Quando isso acontece, descobrimos que não somos mais afetados pelas palavras e ações dos outros. Começamos a ser conscientes de como falamos e interagimos com os outros. Descobrimos que até mesmo algo tão simples como um sorriso tem um efeito profundo nas pessoas.

No meio disso, aprendemos a perdoar os outros, mas, mais importante, aprendemos a antiga arte de perdoar a nós mesmos como o verdadeiro caminho para nos curarmos. Ao fazer isso, percebemos a liberdade como nunca antes. Descobrimos que podemos viver vidas felizes mesmo dentro de cercas de arame farpado. Uma vez que nossa visão se torna refinada, a prisão deixa de ser apenas uma prisão; ela se torna um lugar de libertação.

A prisão não precisa ser um lugar de punição. Pode se tornar um lugar de mudança e esperança. A maioria não tem a visão para admitir que muitos de nós estaríamos provavelmente mortos se não fosse pela barreira restritiva da prisão, desacelerando nossas vidas para que fôssemos obrigados a enxergar um pouco mais claramente.

Nossas vidas giravam em torno de estilos de vida destrutivos. Estamos aqui para reformar nosso pensamento. Temos as chaves para desbloquear nossos próprios futuros; apenas falta um entendimento básico que nos permita ver as coisas como elas realmente são.

Torna-se necessário acalmar um pouco nossas mentes. Isso requer prática, mas pode ser alcançado. A meditação é uma ótima fonte de paz. Apenas sentar-se por dez minutos todas as manhãs pode lhe colocar no caminho certo. Mudar o seu dia muda sua semana, mês, ano e vida.

Experimente. Sente-se em silêncio e concentre sua mente. Foque em Jesus, Maomé, Jeová ou em uma força superior. Medite em uma flor ou em uma cor favorita, se desejar. Qualquer coisa que te traga centralidade e tranquilize sua mente. A porta para a verdadeira liberdade está sempre lá; só precisamos atravessá-la.

Alfred McGlory escreve do Centro Correcional Rayburn em Angie, Louisiana, onde está preso desde 2010. Ele conheceu a Líder Facilitadora do Projeto Upaya Prison, Jane Steinberg, quando escreveu para o projeto perguntando sobre o Zen, há três anos. Alfred tem estudado os Preceitos e o Nobre Caminho Óctuplo com Jane e pratica meditação diariamente. Sua libertação está programada para 2040. Entre em contato com Jane pelo e-mail jane@upaya.org se você gostaria de se envolver com o Projeto Upaya Prison.

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