Foto: Elise Bozzetto

As vidas e a liberação da Princesa Mandarava

Nesse mês de março, trechos da biografia da princesa Mandarava, a história de uma mestra budista que superou as dificuldades e atingiu a perfeita liberação como mulher


Por
Revisão: Josiane Tibursky e Lia Beltrão
Transcrição: Cristiane Schardosim Martins
Tradução: Jeanne Pilli e Marcelo Nicolodi

Selecionamos dois pequenos trechos do livro que acabou de ser traduzido para o português e publicado pela Editora Bodisatva sobre a liberação da Princesa Mandarava, e os transcrevemos com a intenção de que possa beneficiar muitos seres, encorajando-os no caminho espiritual. O trecho da introdução é de Janet Gyatso. A versão para o inglês é de Lama Chönam e Sangye Khandro e para o português, de Jeanne Pilli e Marcelo Nicolodi. Para adquirir o livro, visite a loja da Bodisatva.


Introdução

As Vidas e a Liberação da princesa Mandarava é uma história extraordinária, extraída do coração da cultura religiosa tibetana, sobre a liberação de uma mulher segundo a tradição budista. Recontada a partir da perspectiva magistral de uma buda – Pandaravasini – e suas emanações no mundo, a história relata as várias vidas em que se manifestou compassivamente em locais samsáricos conturbados, onde a heroína usa seu esplendor, poderes mágicos e, muitas vezes, seus encantos femininos para domar demônios e ensinar as mensagens budistas sobre a impermanência, a compaixão e a visão iluminada a todos. A história dessa supermulher tem uma qualidade de contos de fadas que, no entanto, é contrabalançada pelos problemas da vida real das mulheres na sociedade indiana e tibetana repetidamente abordados nesta obra: a premissa de que todas as mulheres devem se casar, o controle de suas vidas pelos homens e a falta de respeito pelas mulheres na sociedade em geral. No longo episódio final da vida da heroína, como consorte de Padmasambhava, esses temas são evidenciados pelos conflitos com os pais e pela censura daqueles ao seu redor sobre o seu controverso relacionamento com o mestre tântrico. Ela, finalmente, sai vitoriosa em todos esses confrontos, mas só depois de um árduo caminho de autocultivo e autoexpressão.

Janet Gyatso

Capítulo 20

Conduzindo Cem Nobres Mulheres ao Darma

Uma vez ao dia, o Rei de Zahor subia ao topo do palácio, onde observava as atividades que aconteciam fora dos portões. Ele sempre assistia às várias competições que ocorriam e avaliava cada esporte. Se gostasse do esporte, ele o elogiava, e se não gostasse, ele o depreciava. Todos os súditos do reino eram obrigados a observar rigorosa disciplina sob seus olhos vigilantes. Durante esse período, a rainha, com sua família e atendentes se banhavam e depois se aventuravam fora dos limites do palácio, adornadas com belas roupas e ornamentos.

Um dia, Mandarava quis sair para um passeio. Ela perguntou se as donzelas atendentes gostariam de ir junto. Elas responderam afirmativamente, e todas partiram juntas para uma longa caminhada. Depois de passarem por uma densa floresta, chegaram a um grande lago entre uma montanha e um vale. Mandarava começou a caminhar diretamente sobre o lago. Depois ela se dirigiu ao grupo de mulheres, dizendo o seguinte: “Jovens que decidiram me acompanhar até aqui, por favor, ouçam o que tenho a dizer. O que neste nosso mundo lhes traz prazer? O que vocês realmente desejam realizar? Respondam, por favor”.

As mulheres responderam:

Nosso maior desejo é nos tornarmos como você, deusa Mandarava. Desejamos ser de casta e classe nobres, da realeza e ter riqueza. Se nos casarmos, só desejamos nos casar com um príncipe da família real e viver felizes para sempre no grande palácio de nove andares!

Depois de ouvir isso, Mandarava pediu que elas escutassem com muito cuidado:

Cada uma de vocês deve examinar sua própria mente, para verem como desperdiçaram suas vidas devido às suas necessidades e seus desejos. Donzelas descuidadas, apossem-se de suas mentes! Nós, mulheres, estabelecemos as sementes do samsara desejando ardentemente os prazeres comuns. Não importa quão bonitas vocês sejam, sua beleza e juventude são ilusórias. Até mesmo doenças insignificantes podem levá-las a status inferiores. Suas mentes e olhos são tão mimados que não conseguem nem mesmo ver a necessidade do precioso Darma! Vocês poderiam ser facilmente persuadidas e seduzidas por companheiros negativos que as levariam aos infernos. Vocês abririam mão de seus corpos e até de suas vidas por seus maridos, mas depois de algum tempo perderiam o controle e começariam a discutir e brigar incessantemente e experienciariam um sofrimento ainda maior que o dos habitantes do reino dos deuses invejosos. O sofrimento do nascimento e da morte está além de sua imaginação.

Considerem as maneiras pelas quais o carma produz frutos. Todos os dotes e todas as riquezas e posses deste mundo são como uma ilusão ou um sonho, destituídos de existência verdadeira. Beleza e dotes são como um arco-íris desaparecendo no espaço. Mesmo estando presentes agora, nunca poderão ser permanentes. Um maravilhoso palácio de nove andares adornado com as cinco joias preciosas é, em si mesmo, uma ilusão e uma causa de queda. A juventude e a beleza são como uma flor de verão, incapaz de suportar o início do envelhecimento e destruída pela primeira geada. Sedas e joias caras são como gotas de orvalho na grama. Embora presentes agora, desaparecem em um instante ao primeiro vento forte. Todos os parentes, amigos e atendentes reunidos são como visitantes em um mercado. Em um instante reunidos, no instante seguinte inevitavelmente separados. A essência de sua própria vida é como uma vela tentando resistir ao vento forte: não há como determinar quando se apagará, e precisa ser protegida com muito cuidado. Poder e fama são como um rugido de trovão no céu: depois de ouvido por um instante, torna-se um eco inútil. Seja como for, tudo isso tem menos essência do que um punhado de migalhas.

(…)

Apoiadores

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *