Neste mês de junho, Kazuaki Tanahashi Sensei esteve em Brasília e Alto Paraíso e a sanga do CEBB local compartilhou conosco seu olhar sobre o movimento deste grande mestre
Após sua passagem no Sul, Kazuaki Tanahashi Sensei veio até o Centro-Oeste para continuar suas atividades no Brasil. Não raro, quando se escuta falar de grandes mestres, praticantes de vários lugares do país se organizam para encontrá-los, mesmo que seja em silêncio, ou escutando suas palavras e observando seus gestos. Carecemos de exemplos de florescimento humano.
Dizem que Kaz tem 84 anos e, embora a barba e os cabelos sejam grisalhos, é difícil enxergar onde se assenta essa idade. A energia pacífica e disposta com a qual Kaz Sensei se move deixou muitos impressionados. Durante toda sua passagem pelo Centro-Oeste, postura ereta, completamente desperto, disponível. Pontas dos pés no chão, flutuava no ambiente com uma presença leve, amorosa, generosa, e um silêncio profundo que dele parece emanar. Olhos brilhantes, perfeitamente atentos, serenamente presentes. Completamente transponível e translúcido.
Na noite de quarta-feira (13/06), no Templo Shin Budista de Brasília, Kaz Sensei se apresentou ao público, tentando transmitir o que por vezes a linguagem não consegue expressar: A explicação para um dos elementos chaves do Sutra do Coração, a invocação do bodisatva “Avalokiteshvara”. Dentro da vastidão deste tema, Kaz Sensei explicou duas grafias diferentes para o nome do bodisatva, cada qual elucidando facetas particulares desta inteligência inseparável dos Budas: Avalokiteshvara, traduzido por “aquele que percebe as vozes de sofrimento do mundo”, e Avalokitashvara, “aquele que percebe com liberdade”.
Durante a tarde e noite de quinta-feira, Kaz Sensei conduziu oficinas de caligrafia. Vários participantes saíram nitidamente impactados pela experiência, alguns soltavam exclamações apreciativas, outros, sorrisos maiores que o rosto. A mão e o pincel de Kaz Sensei, juntos, comunicavam a força e sutileza de sua mensagem.
No fim de semana de 15 a 17/6, Kaz Sensei conduziu no templo do CEBB Alto Paraíso um retiro sobre o Sutra do Coração, talvez o mais importante Sutra do Budismo Mahayana. Ainda que este ensinamento esteja além da palavra e do conceito, motivados em estender os ensinamentos do Darma a todos os seres, Kaz Sensei e Joan Halifax Roshi colocaram em papel e tinta uma tradução que pudesse beneficiar qualquer pessoa falante do inglês (e agora do português!). Mesmo que alguém não tivesse conhecimentos profundos do budismo, o destrinchar das palavras, o cuidado com a precisão linguística e o trabalho de revirar a história do nascimento do Sutra foram suficientes para impactar todos com o entendimento sobre a sabedoria além da sabedoria.
Mesmo para os tradutores, a situação de convívio com Kaz Sensei, e o texto como um todo, foram inspiradores. Não basta apenas entender a palavra e escolher uma outra, é preciso ser perpassado pelo sentido, pelo significado e, se possível, pela realização do que é transmitido. Kaz Sensei escolhia as palavras com precisão cirúrgica, usando de uma linguagem repleta de vocábulos e expressões unívocas.
Ao final do retiro, no domingo, Kaz Sensei pediu para sentar em roda com todos presentes. Com muita humildade, relatou que nem em seus sonhos mais desvairados ousou imaginar que um dia daria ensinamentos numa cidade do interior do Centro-Oeste brasileiro. Pediu a todos que falassem espontaneamente da sua experiência no retiro, incluindo as críticas. Muitos engasgaram com o choro. Entre presentes e elogios, talvez a única crítica tenha sido a de um relatante, que parafraseou uma brincadeira do Kaz Sensei ao dizer que não se iluminou no final do retiro.
Na terça-feira seguinte, já de volta a Brasília, durante a montagem da exposição no Museu Nacional dos Correios, Kaz Sensei tentava dar um nó nos fios de náilon e não conseguia. A cada vez que falhava, ele ria e se divertia muito genuinamente. Depois da quinta vez, alguém disse “They get tangled, right?” (eles se embolam, né?), ao que o Sensei respondeu “Kind of like life, dont’t you think?” (meio que como a vida, não acha?) e soltou uma gargalhada suave, leve.
E assim foi sua passagem no Centro-Oeste. No sul do Brasil, Kaz Sensei disse que traduzir é estar sempre derrotado. Talvez também seja assim com o traço do pincel que sai do controle, ou com os fios de náilon. Ou com a vida. Cada gesto, cada momento é completo, precioso. E nos parece que Kaz Sensei vive exatamente isso.
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