Narrativa da experiência em retiro assinada por Carlos Ernesto de Oliveira na revista Bodisatva, em 2009. Revisitada em maio de 2017
No início de janeiro, estive em Viamão, em um dos retiros de verão do nosso querido Lama Samten, e duas coisas me chamaram muito a atenção: a primeira foi em uma noite em que o mestre abriu para perguntas e respostas, e em que, como costuma ocorrer com certa frequência, os assuntos saem um pouco do foco do tema, ou acabam por entrar pela seara da discussão cognitiva, sem gancho aparente na prática.
Após cerca de uma hora e vinte minutos amparados na costumeira paciência e gentileza do mestre, ele disse algo mais ou menos assim:
Quando perdemos o foco ou o gancho na prática, a impaciência, uma forma branda de raiva e medo, se manifesta, e vocês podem imaginar meu alívio com as palavras do mestre. Ao mesmo tempo em que agora procuro não deixar a impaciência tomar conta, vejo também que perder tempo pode ser um problema.
A segunda foi o encorajamento que o Lama nos deu para falarmos de nós e de nossas práticas aos demais, que me pareceu uma coisa muito boa; imagino que isso dependa muito de cada um, pois pode ser difícil abrir nossas vidas, mas para mim é uma forma de tornarmos a sanga mais efetiva, pois quando contamos sobre nós, podemos auxiliar quem nos ouve, principalmente quem está começando, e receber suporte dos praticantes mais experientes, que podem ver as limitações de nossa prática com maior discernimento.
Nesses seis anos em que tenho tido as bênçãos dos ensinamentos, da paciência e da presença do Lama Samten, e me beneficiado do suporte e do carinho da sanga, em especial dos praticantes de São Paulo e de Campinas que têm a disposição de aparecer nas minhas práticas, fico com a certeza de que os milagres existem, pelas mudanças cada dia mais fortes e positivas que estão efetivamente ocorrendo.
Quando comecei, não conseguia meditar, a começar com a dificuldade de sentar-me no chão, passando pela estabilização de energia e mente, que sempre foram obstáculos significativos devido ao meu déficit de atenção. Hoje não só estou me sentando no chão com mais facilidade, como consigo estabilizar mente e energia com relativo sucesso na prática formal, e vejo com alegria a meditação se ampliando pelas demais horas do dia, ajudando a não ceder a impulsos automatizados danosos. E não tomo mais remédios para o DDA/TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), só nas crises mais agudas, que têm acontecido com intervalos de meses, intervalos crescentes.
Com isso entrei na prática pela ação, procurando cada vez mais não causar danos e gerar benefícios, dando nascimento positivo ao outro, uma vez que a etapa de visão estava também um pouco difícil, pois sempre tive dificuldade com a noção de absoluto, que na minha criação cristã se chama Deus. Quando o Lama falava em Buda Primordial ou natureza ilimitada, eu pensava: “Estou frito. Não vai funcionar!”. Mal sabia eu das boas surpresas à frente, no nosso lindo caminho.
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